:: Incomodados, pra quê?


Uma estranha controvérsia surge com a publicação feita por uma importante colunista da ‘high society’, Hildegard Angel, sobre o controle das praias cariocas, evitando-se o aglomerado de pobres, perdão, pessoas que a superlotam nos finais de semana. Diante das comparações sofridas, à luz do que escreveu, a jornalista chegou a tirar o artigo do site. 

Não foi bem interpretada (Hã? Como assim?). 

"Isso é embaraçoso, não? Parece que não encontramos o que você está procurando. Talvez a busca, ou um dos links abaixo, possa ajudar". Esta é a mensagem que aparece na página da jornalista Hildegard Angel, na tarde desta terça-feira, no lugar de texto publicado nesta segunda-feira, onde ela sugeria, em dois tópicos, que a redução da violência no verão carioca não merecia ações "titubiantes" do poder público. As medidas propostas, no entanto, geraram uma repercussão negativa e provocaram uma chuva de críticas à jornalista, que chegou a ser acusada de simpatizar com ideologias nazistas.

Interessante que a controvérsia sobre a presença dos pobres e das periferias "assumindo" seus direitos em todos os locais públicos da cidade nos chamou a atenção para outra discussão: nas igrejas cristãs, por que incomoda a presença de pessoas homoafetivas "assumindo" seus direitos como qualquer outra ou buscando ter os mesmos direitos nas dinâmicas paroquiais, diocesanas e até provinciais já conferidos a qualquer outra?

“Ah, mas somos todos iguais!”, dirão. Em alguns lugares, sim, é fato. 

Mas, e no tocante aos lugares onde nem todos sejam tratados ou desejados como iguais? Por que é tão difícil compreender que "Deus não faz acepção de pessoa?"

Por que nos revolta tanto a possibilidade de, por exemplo, um casal homoafetivo aparecer num jantar de casais ou receber aquela linda oração de ação de graças diante do altar e de todos no ofício eucarístico após saber que eles ou elas estão "grávidos" ou que a adoção já lhes foi conferida judicialmente? Por que a mesma congregação que se emocionaria (ou talvez nem expressaria qualquer reação, de tão acostumada) com os mesmos fatos acontecendo a um casal heteroafetivo, reagiria diferente em outros casos com seus irmãos? O diferente incomoda! Mas por quê?

O que nos falta compreender e acolher na fé que dizemos ter?

Não vale repetir o chavão “nós amamos a todos, mas não compactuamos com o pecado” porque o bom senso e a lógica dos fatos — “não há um justo sequer” — nos obrigará a perguntar: como não compactuar com o pecado se você também está dentro?

Como será que nosso olhar de juízo interpreta quando está claro que Deus, a quem servimos, assegura que não faz acepção de pessoa alguma?

No fundo, todos compreendemos Hildegard Angel e não poucos ricos quando não querem dividir nem coexistir ao lado de pobres, gente feia, deselegante e farofeira. No fundo, todos sabemos, uma igreja plural, diversa e inclusiva dá o trabalho de ser cristão. É mais razoável — alguns dirão “senso comum” — criar igreja para iguais, onde o diferente seja apenas aquela minoria discretamente invisível e calada pelo discurso advindo dos majoritariamente iguais. Isto tanto vale para as chamadas “igrejas não inclusivas” como para as auto-proclamadas “inclusivas” cuja essência é a mesma: igreja para apenas iguais.

Talvez Hildegard "só" quisesse falar dos assaltantes quando sugeriu as medidas para impedir o fluxo de pobres, digo, pessoas nas praias cariocas. Será? A desculpa é a violência que eles, os pobres, causam? Ricos não são violentos? Eles não exploram e desviam milhões dos cofres públicos (que certamente faltarão para uma enormidade de benefícios a toda a população)? Não se está aqui defendendo quem arranca cordões, relógios e celulares nas areias das praias. Não se trata disso, mas qual a justificativa plausível para toda forma de violência empregada? O preto, pobre e feio que arranca cordões de ouro é mais perigoso que o rico, culto e sofisticado que usa laranjas para desviar milhões?

Nós não queremos ser Hildegard Angel nas suas infelizes colocações elitistas. Incomodados, pra quê? Já incomodamos os sistemas vis, intolerantes e opressores deste mundo que jaz no maligno sendo quem somos, isto é, cristãos!

Nós queremos "apenas" ser discípulos de Jesus de Nazaré, aquele acerca de quem o profeta Isaías diz que "não tinha beleza nem formosura e, olhando nós para ele, não havia boa aparência nele, para que o desejássemos" (Is 53,2); queremos enxergar a vida pela ótica do Marginal Galileu que era pobre, andava, comia e se vestia como pobre, no meio dos pobres, mas era — como é! — o Rei do Universo, a Palavra de Deus Encarnada, pois pelo Seu Poder tudo o que existe lhe diz "glória!", não carregava este grilo na expressão da fé simples que encarnava em gestos, olhares, abraços, beijos e sorrisos. Não nos esqueçamos que ele comia e bebia como um glutão, diziam seus críticos... Jesus farofeiro!

Este mesmo Pobre Marginal Ungido (por isso, Cristo) não se incomodou em dividir sua praia num dia quente qualquer do Oriente Médio com quem quer que fosse... "Vinde após mim", era o que dizia... para escândalo das/dos Hildegard Angels de sua época!

Tudo isto é para você pensar sobre a igreja que realmente queremos (e que certamente incomodará a muitos e muitas Hildegard Angels).

Com o carinho do Cristo Excluído, seus conservos.

Movimento Episcopaz
Anglicanos Pró-diversidade & Pela Paz
14/01/2015


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