:: A fé, o léxico e Deus ::..

:: Breves reflexões acerca da decisão da Câmara dos Bispos da Igreja da Inglaterra sobre bênçãos para casais do mesmo sexo e da própria inclusão no seio da Comunhão Anglicana, em especial no Brasil ::




Recentemente uma decisão tomada pela Câmara dos Bispos da Igreja da Inglaterra, que é Igreja Mãe ou, para muitos, a Igreja Avó de muitas igrejas na Comunhão Anglicana, surpreendeu muita gente com o toque conservador na manutenção de um “status quo” em celebrar bênçãos matrimoniais apenas para casais de sexo diferente. Houve quem imaginasse que a decisão afetaria a todas as igrejas espalhadas pelo mundo. Não. Uma coisa é a Comunhão Anglicana, que muito nos orgulha ao caminhar como sinal vivo de Unidade em meio à diversidade; outra coisa são as diversas Províncias (o Brasil, por exemplo, é a 19ª Província da Comunhão Anglicana). Nossa Igreja tem estrutura, governo e decisão próprias. Assim o é com as demais Províncias.

Em relação à nossa Igreja, no entanto, o tema tem sido discutido com profundo respeito e com sinais de acolhida e inclusão, por meio de iniciativas nascidas dentro da Igreja e que já resultaram em cartas pastorais oficiais e debates teológicos, como o que nossa Pastoral tem promovido e continuará promovendo até que a decisão final seja tomada pelo Sínodo extraordinário que muito em breve teremos. A questão perpassa muito mais pela adequação de alguns termos face ao avanço da sociedade e à maturidade do tema (como um dia já o foi com a ordenação de mulheres). Nada tem a ver com exclusão nem com exclusividade. Muito ao contrário. Tem a ver com inclusão, que é respeito pela diversidade. E diversidade tem a ver com o que é diverso, jamais com o que é exclusivo.

Alguns termos, portanto, precisam ser repensados ou até mesmo ressignificados. Nosso desejo e nossa oração é que o Senhor continue nos guiando rumo ao Alvo, que é Cristo e seu modelo humano de acolhimento, respeito e diálogo até com quem crê e pensa diferente de nós. Jesus que sempre incluiu, mas jamais forçou ninguém a ser incluído. Jesus que incluiu mas que não privilegiou uns em detrimento de outros (a chamada “exclusividade”, que contrariando o fundamento do amor, tende a criar guetos e a valorizar apenas a homogeneidade).

Na Casa do Pai há muitas moradas-ser... Jesus tem-nos preparado lugar. Creiamos em Deus. Creiamos em seu amor. Prossigamos incluindo, cuidando para que os termos não acabem perdendo seu real significado. Prossigamos amando, cuidando para que não sejamos tentados a imaginar que “diversidade” é quando todos crerem, pensarem ou decidirem igual.

A Igreja da Inglaterra e a Igreja do Brasil, ambas unidas e co-irmanadas na Comunhão Anglicana, permanecerão pregando a diversidade e dentro dela o respeito que se deva ter pelas decisões de sua maioria. Enquanto eles entendem, por decisão de maioria, que este ainda não é o momento; nós permaneceremos profetizando o que cremos e proclamando o que já experimentamos: DEUS NÃO FAZ ACEPÇÃO DE PESSOA ALGUMA. 

Por que faríamos nós, IEAB?

Por que faríamos nós, anglicanos, amigos e aliados da diversidade?

Daí, por léxico, entendemos que não há como crer e não oferecer os caminhos para que o que se crê aconteça. Daí, por fé, não há que se falar acerca do amor de Deus criando barreiras ou impondo limitações ao entendimento. Fé, não nos esqueçamos, é sempre um salto para "além do que se vê!"

Aos que desejarem, os links abaixo ajudarão na melhor compreensão do que temos realizado:


O Verniz e a Madeira (artigo do Rev. Eduardo Calvani) publicado no blogue do Episcopaz e também no portal Palavra Aberta.


Nota oficial da IEAB sobre a decisão da Suprema Corte brasileira quanto às uniões homoafetivas (2011)

Por fim, a Parábola dos Talentos tem muito a nos ensinar sobre Unidade em meio à Diversidade. Jesus nos ensina no evangelho conforme São Mateus (cap. 25) que o Reino de Deus é semelhante à situação de alguém que confia a seus operários seus bens, distribuindo-lhes “segundo sua capacidade” (de administração dos bens/ de cuidado, sabedoria e inclusão dos temas cotidianos diante do avanço da sociedade). Cada qual recebe de uma forma. Houve diversidade de maneiras. O amor e o respeito de Deus foi igual para com todos, embora nem todos tenham recebido a mesma porção... embora nem todos estivessem aptos para discernir naquele momento a mesma coisa...

Assim é Deus para conosco.

Assim é Deus para com nossa maturidade e “capacidade” de lidar amorosamente com todos, sem exigir que todos “recebam a mesma quantidade de talentos”, isto é, sem que todos tenham que agir da mesma forma ou que apenas alguns possam se casar.

Deus sempre vai além porque Ele é o Todo Amor.

Nós, que somos peregrinos no chão desta terra, que ora acertamos, ora nos equivocamos rumo à "estatura de varão perfeito" ou "à medida da estatura completa de Cristo", parafraseando São Paulo aos Efésios, é que ainda estamos aprendendo com Ele a respeitar e a acolher a diversidade, bem como a crer, por meio da fé, que cada qual tem sua própria capacidade para entender que o Amor de Deus vai sempre muito além do que já cremos. Pela fé ousamos afirmar: ou você crê ou você não crê


Todavia, crendo ou não crendo, Deus continuará sendo Todo Amor... e a uns dará cinco talentos, a outros, dois; a outros, um, mas de todos requererá que multipliquem os talentos (e aqui ousamos ressignificar o texto conforme o espírito do Evangelho, de modo que seja a própria capacidade de ser Luzeiro, sem medo de "mudar o pensamento" [metanoia, isto é, "conversão"] em meio aos avanços dos temas cotidianos) e que ofereçam ao mundo muito mais do que receberam.


 
A todos aqueles e aquelas que desejam ofertar muito mais, a amar muito mais, a acolher muito mais, nossa gratidão e nosso convite para que juntos continuemos transformando nossa Igreja sendo mãos, pés e abraços de Jesus no meio de uma geração que "coa mosquito e engole camelo".

No abraço de inclusão e acolhida de Deus, por meio de seu Filho Jesus, o qual é o Cabeça da Igreja e nosso Modelo,


Ricardo Pinheiro
19/02/2014

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