PLC 122: uma nota de advento ::..
Palavras de esperança em meio às notas
religiosas contra a diversidade humana ::
Ricardo Pinheiro,
coordenador do Movimento Episcopaz
O Plenário do Senado Federal aprovou, nesta
terça-feira (17/12), com 29 votos favoráveis, 12 contrários e 2 abstenções,
requerimento do senador Eduardo Lopes (PRB-RJ) para que o PLC 122/2006 seja
apensado, ou seja acrescentado ao projeto de reforma do Código Penal (PLS
236/2012). Na prática, isto significa o fim do projeto, pois, agora, ele passa
a tramitar juntamente com a reforma do Código Penal.
Um detalhe interessante digno de nota é que
na mesma terça-feira a Comissão Especial do Senado que é responsável pela
elaboração do novo projeto do Código Penal aprovou o relatório do senador Pedro
Taques (PDT-MT), segundo o qual as referências a “gênero”, “identidade de
gênero”, “identidade sexual” ou “orientação sexual” são retiradas, acatando
emendas do senador Magno Malta (PR-ES), parlamentar integrante da Frente
fundamentalista e que é publicamente conhecido por se opor ao reconhecimento da
cidadania para a população LGBT.
O que alguns chamam vitória (para os parlamentares
ligados a bases religiosas conservadoras) ou, como claramente se percebe, a
derrota (para a sociedade civil e o próprio Estado laico) foi alvo fácil de
muitos pronunciamentos, notas e “hastags” pelas redes sociais, sobretudo de
importantes segmentos religiosos evangélicos e católicos romanos.
Reconhecido pela teatralidade nas falas
neurastênicas (e pelo discurso de virtuosismos supostamente morais), Silas Malafaia não perdeu oportunidade mal saiu o resultado que golpeou de morte o
PLC 122:
“Depois de 7 anos de uma luta árdua contra um projeto de lei que era um verdadeiro lixo moral (...), finalmente o senado deu um basta. Mesmo o PT usando todo o seu poder político para aprovar esta aberração, e tenho eu aqui que ressalvar a atitude corajosa do senador Lindbergh Farias que contrariando a decisão partidária, votou pelo fim do PLC 122/06, ao contrário do senador Valter Pinheiro do PT da Bahia, que é membro da Igreja batista em Salvador, e que muitas vezes eu o apoiei, de maneira covarde se ausentou do plenário na hora da votação. Tenho também que ressaltar o brilhantismo e a luta incansável do senador Magno Malta que foi um gigante para travar o famigerado projeto.”
Dioceses romanas como a de Divinópolis (MG),
Osasco (SP), Campos (RJ), Paraíba e São Sebastião do Rio de Janeiro – até onde
tivemos informação – também vieram a público no mesmo dia se pronunciar contra
o PLC 122 e a favor dos chamados “valores cristãos”, embora não se tenha muita
certeza que “valores” são estes e sob que ótica ou ética são reconhecidos como
tais.
Considerando que nesta última terça-feira os
missionários da Canção Nova conclamavam os fieis pelo twitter numa espécie de
guerra santa contra o PLC 122; embora a mesma atitude era igualmente vista entre
as mais diversas lideranças evangélicas, observa-se que o momento é propício ao
exercício para alguns pingos se encaixarem.
Nem todos os cristãos são conservadores
tanto quanto nem todos os cristãos são “curral eclesial” ou militam contra a
dignidade das pessoas. Há gente honesta, santa e com olhar generoso sobre cada
ser humano.
No meio protestante, bem como no católico
romano e em outras religiões católicas (anglicanas e ortodoxas), veem-se pessoas
comprometidas com a vida como um todo (e não apenas quando o assunto é aborto
ou matrimônio entre pessoas do mesmo sexo), gente que ama e é capaz de andar
uma milha a mais para impedir que consciências sejam violadas, que cultos
religiosos sejam vilipendiados e que a dignidade dos que estão à margem (porque
foram colocados lá!) seja violentada de alguma forma (seja pela denúncia às
desigualdades sociais, à miséria, ao trabalho escravo, à exploração sexual, à
pedofilia, à homofobia e transfobia, etc).
Infelizmente, no entanto, alguns que exercem
a liderança se manifestarão publicamente contra tudo o que se levante contrário
ou diferenciado aos standards pré-estabelecidos (formatados) por eles mesmos e
quem lhes represente, institucionalmente falando.
A pauta do PLC 122, por exemplo, foi um típico
caso de afronta ao padrão moral e ético vigentes naqueles mundos dominados pelo
olhar estreito da religião. Um PLC que assegure que nenhuma pessoa poderá ser
menosprezada ou atingida em sua dignidade, em razão de sua imutável orientação
sexual (como se houvesse botãozinho “Liga” ou “Desliga”) só é encarado como “monstro
de oito cabeças” por alguém que sobreviva sob a máscara do virtuosismo moral
mais primitivo, isto é, que nem sequer considere qualquer outro além do “si-mesmo”.
Ora, o “si-mesmo” não é nada além de um caminho da carne, o qual se esconde sob
o disfarce da santidade moral, mas não consegue esconder a perversão do ser,
especialmente na forma do orgulho e da vaidade de sua falsa superioridade.
Lendo as notas publicadas por algumas
lideranças romanas, é de se imaginar como será árdua a tarefa de uma figura tão
simpática quanto verdadeiramente cristã, como parece ser o papa Francisco, na
reformulação de sua igreja, se é realmente fato que a proposta é mudar
sobretudo o Magistério (coisa que nenhum papa o fez, pois se diz no Direito Canônico
que é imutável). Enquanto isso — considerando uma suposta e histórica possibilidade
de mudança no Magistério — vamos
assistindo espetáculos cuja mise-en-scene se dá pelos hastags contra aqueles
que desejam acabar com “os valores cristãos” e derrotar a Igreja, mas também
por notas como estas:
"É meu dever de pastor esclarecer aos cristãos católicos e à população sobre a lei natural e os Mandamentos da Lei de Deus (lei positiva), ao tempo em que expresso o meu absoluto e total repúdio ao PLC 122 e seus substitutivos que incluem a homofobia ao Plano Nacional de Educação... Ora, o que alguns grupos de pressão pretendem com a lei da homofobia é impor um totalitarismo anticristão, em nome da ideologia de gênero e, com este, provocar ódio discriminatório, repudiado pela sociedade, adepta dos valores cristãos (...).
Concluo afirmando que a lei da homofobia tenta proibir o sagrado direito que as Igrejas cristãs têm, em sua missão outorgada por Cristo, de fazer discípulos e de ensinar o que Ele praticou, ensinou, como comportamento ético e moral.”
João Pessoa (PB), 17 de dezembro de 2013.
Aldo di Cillo Pagotto,arcebispo Metropolitano da Paraíba
No mesmo dia, a Arquidiocese de São
Sebastião do Rio de Janeiro, em nota assinada pelo arcebispo, D. Orani Tempesta, e todos os seus bispos auxiliares e vigários episcopais, púbica em
suas redes sociais a posição contrária em relação ao PLC 122, afirmando que a
“função eclesial e social da família [está] fundada sobre o matrimônio entre um
homem e uma mulher.”
E o que os anglicanos poderiam — e deveriam — ter falado, mormente num momento em que
muita gente se encontra desesperançada com a possibilidade de nos tornarmos uma
democracia vendida aos toma-lá-dá-cás dos segmentos fundamentalistas (católicos
e evangélicos) e a pressão que exercem sobre o Congresso? Afinal, estamos no
advento. Até onde os cristãos entendemos é época de renovar a esperança, pois o
Cristo dos publicanos, das putas e de todos os marginalizados de Nazaré está
vindo.
Esperança é a essencialidade do Evangelho, a
Grande Mensagem de Salvação (GMS) enviada para dentro do ser de todo aquele que
crê. Evangelho que é a GMS de esperança
para a presente existência e para a vida que é sem fim. Esperança mesmo que o
mundo desabe, que deputados ou senadores se dizendo cristãos manobrem contra a dignidade do
ser humano; que pastores, bispos e arcebispos rabisquem notas de repúdio a toda
forma que ousa ser “fora-da-fôrma” (porque ensinam que o inferno é dos
diferentes!) crendo com isso que estão dando glórias a Deus e "salvando a célula-mater da sociedade" da eversão moral. Esperança, que é construída como caminho histórico existencial em cada
um de nós, o qual começa na fé. Ora, pela fé ousamos e exultamos de esperança,
ainda que diante do absurdo da existência que se levanta contra a diversidade
da Criação.
E já que falamos de fé ao falar de
esperança, é por ela que mergulhamos nos plenários da Graça na qual estamos firmes e saímos sempre vencedores, ainda
que a gente só entenda lá na frente... quem sabe, quando muitos brasileiros se
conscientizarem que uma urna eleitoral pode ser o grito dos excluídos. Assim, aprendemos a nos gloriar na
esperança da Glória de Deus que chegará para todos nós que estamos engravidados pelos
sonhos de um país mais democrático, mais plural, mais sensível às estatísticas
de morte das vítimas tombadas pelo ódio e pelos discursos religiosos de “uma só
forma de família” e de “uma só identidade de gênero”.
Firmados no Cristo de pés descalços e mãos calejadas por tanto amar, o Evangelho nos convida a prosseguir ao som da esperança. Um dia a dignidade de todas as pessoas será defendida por todo aquele e aquela que se disserem cristãos, mas não apenas com palavras e sim com acolhimento. Famigerada será toda tentativa de desconstrução do Caminho, da Verdade e da Vida na individuação humana (fruto da diversidade) para se tornar concurso de aparências e baile de máscaras em favor de um "ethos" que não se sustenta diante do Escândalo da Cruz. Sim sim; não não é que sairá dos lábios de quem, verdadeiramente, defenderá a vida (com todas as implicações indissociáveis a ela, da cor da pele à orientação sexual). Nada de abstenções.
Fontes:
Obrigado pelas palavras...
ResponderExcluirNós é que agradecemos pela presença neste blogue, pela leitura e pela meditação!
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